Guanabara: um mapa descritivo, por Pedro Ávila

o carnaval é uma convalescença
a baía de guanabara é bela
pelos dentes an-
gulosos — arranha-céus
de boca — de banguela

todo mundo samba cego nela
— édipo de bengala
— abadá: traje de gala —
— lá gallus gallus não cantam manhãs
urubus almoçam carcaça-
moça de sacoplástico e tar
ta-
rugas na areia suja

por onde surgem andarilhos fugentos
pulguentos guabirus retirantes
rattus rattus alados
primogénitos a correr o fado
multiplicados por pi
-xels mal roenderizados
Amália Rodrigues pia com a guitarra
num disco roído e arranhado

devido à poeira e aos ciscos
suspendidos pelos sismos
das cismas de fragatas gringas
gritando noutra língua —
turistas atrás de encher a boca aqui

de salgados peixes cérberos ali-
mentados a lenga-lengas —
— tendo de 7 barcas zarpado —
sem aguentar os 40 degraus Celsius
do chão de grãos degra-
dados jogados ao azar — do sol-
o de proto-vidro

praia infectada en-
festada de bichos mutantes
fresta de sol que cresta a pele
fukushima antropixalista
ilha de lábios radioativos
ósculos torpes miopes
se s(us)-
urrando hulk de dor

um fudum só

 

(2019)

4 comentários em “Guanabara: um mapa descritivo, por Pedro Ávila”

  1. Belo e contundente poema resistência e resiliência, na boca aberta da praia da Guanabara. Poema maduro é impactante.

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